Com a demanda em queda livre por conta da inflação, as redes de supermercados têm trabalhado com estoques menores e buscado equilibrar pedidos, ao encomendar apenas a previsão do que o consumidor vai de fato comprar. Com essa maior seletividade, porém, tem aumentado a queda de braço entre lojistas e indústria, que tem sido mais criteriosa nos descontos para grandes encomendas.
Os lojistas, em geral, têm acertado nas previsões. O chamado índice geral de rupturas (produtos que faltam nas prateleiras) calculado pela Neogrid, empresa especializada em cadeias de suprimentos, teve queda em junho, para 11%, ante 11,5% de maio. Esse indicador mostra faltas pontuais, em razão de estoques menores e entregas postergadas. Embora no geral o índice tenha melhorado, esse cálculo não vale para itens importantes, como ovos e leite.
Segundo Robson Munhoz, diretor da Neogrid, o varejo vem trabalhando com o menor índice de estoques em dois anos. “As varejistas não estão mais comprando por oportunidade, mas por necessidade. Diversas indústrias têm limitado os volumes e, por isso, os descontos concedidos têm sido mais criteriosos”, afirma.
A indisponibilidade do leite longa vida nas gôndolas atingiu em junho o maior patamar em um ano, e o segundo maior desde janeiro de 2019.
Segundo dados da Neogrid, a falta do item nas prateleiras registrou índice de 19,4% em junho, ante 18,8% no mês anterior. Outro produto que também registrou alta de ruptura em junho, também para 19,4% (segunda maior no ano), foram os ovos, que acabam substituindo a proteína animal em muitas mesas. Em maio, o índice era de 17%.
No caso do leite, Munhoz diz que a ruptura elevada deve se manter até o fim deste trimestre. Entre os motivos estão a estiagem, o aumento no custo da ração do gado e a alta do leite no varejo. “Isso afeta também parte dos derivados, como leite condensado, iogurte, queijos, entre outros”, explica.
Já os ovos obedecem a outro fenômeno: “O dólar aumentando, a situação ainda de guerra na Ucrânia, a inflação elevada e o aumento nas tarifas de luz causam efeitos em toda a cadeia de abastecimento. A indústria não consegue sustentar aumentos e precisa repassar parte do custo – com supermercados registrando margens muito apertadas e também não conseguindo segurar o reajuste dos valores. Isso afeta o consumidor final, que passa a buscar marcas mais baratas, troca proteínas pelas mais em conta”, diz Munhoz.
Diferentemente do leite que, no mesmo período de 2021, estava em um patamar parecido de rupturas (em 19,2% frente os 19,4% de agora), os ovos estão 2,4 pontos porcentuais acima do registrado em junho de 2021.
Negociações
O vice-presidente institucional da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Marcio Milan, afirmou, na quinta-feira passada, que a entidade tem estimulado os associados a negociar mais intensamente com a indústria. A lógica é entender os aumentos de preços e identificar altas injustificáveis. Ele diz que as negociações têm sido mais longas, mas que isso não tem causado desabastecimento nas lojas.
“Não identificamos falta de produtos em razão da maior negociação de supermercados com indústria”, disse Milan. Ainda assim, eventuais rupturas podem ocorrer. “É algo inerente à operação dos supermercados. Em momentos inflacionários, há normalmente uma tendência disso aumentar.”
Como a demanda está menos aquecida, porém, essas rupturas estão menos frequentes. O consumo nos lares brasileiros subiu 0,39% em maio, ante o mesmo mês de 2021. Na comparação com o mês imediatamente anterior, porém, houve queda de 3,47%, influenciada pela sazonalidade. Os dados são da pesquisa Consumo nos Lares Brasileiros da Abras.