Se para alguns os cachorros são os melhores amigos dos humanos, para outros eles podem ser o melhor remédio. Com resultados terapêuticos comprovados, os cães de suporte emocional são uma das alternativas de tratamento para quem tem diagnóstico de ansiedade, pânico e depressão.
Eles andam tão bem na fita que agora têm o direito de ir e vir ao lado de seus tutores garantidos pela lei, e até crachá de identificação, com foto e tudo. As primeiras carteirinhas foram entregues a cinco cachorros, no início do mês, no Rio de Janeiro.
Uma das primeiras a receber a licença foi a bióloga Danielle Cristo, tutora do Rudá, seu segundo cão de suporte emocional, que a acompanha até no trabalho para onde vai de metrô e VLT.
— O cão de suporte emocional me acompanha em tudo o que é lugar. Um pet, não — diz Danielle, que se sente mais segura com seu companheiro por perto. — É a mesma coisa que um cão guia é para um cego. Ele facilita a minha locomoção e a minha interação com as pessoas. Quando não estou com ele, é tudo mais tenso.
Com a morte da mãe, em 2010, ela conta que as coisas ficaram tumultuadas dentro de casa. Danielle desenvolveu um transtorno de ansiedade, que começou a ser tratado com terapia. Depois de algumas sessões, veio o Prince, um golden retriever, seu primeiro cão de suporte emocional.
A história de Danielle ajudou a autora do decreto, Marina Rocha, ex-deputada estadual e atual prefeita de Guapimirim, a desenhar a Lei Estadual 9.317/2021 que, não à toa, foi batizada como Lei Prince.
Justamente por ultrapassar a fronteira do pet friendly, a lei traz algumas garantias, como o livre trânsito em locais públicos ou privados de uso coletivo, qualquer meio de transporte público e em estabelecimentos comerciais no estado. A única restrição é em relação a locais em que seja obrigatória a esterilização individual. Até agora, pelo menos 20 tutores já entraram em contato com a Secretaria estadual de Agricultura, responsável pelo controle das licenças.
A multa para quem descumprir a lei chega a R$ 4 mil — valor destinado ao Fundo Especial de Apoio a Programas de Proteção e Defesa do Consumidor.
Raças dóceis
Tutora de outros dois cachorros, Patrícia sabia que Ayla era diferente, mais companheira que os outros. Mas teve a confirmação quando soube da notícia da morte de sua mãe, por Covid-19, no fim de 2021.
— Estava sozinha em casa quando recebi a ligação. Na hora, ela pulou na minha cama e ficou me lambendo devagarinho até eu me acalmar — conta Patrícia, relembrando da importância daquele momento. — Ela me salvou. É a minha vida.
Segundo Elaine Chagas, psicóloga e sócia-diretora do Instituto de Ensino, Pesquisa e Atendimento em Saúde Mental (InTCCRio), os benefícios da Intervenção Assistida por Animais (IAA) estão sendo cada vez mais embasados cientificamente e, por isso, cada vez mais utilizados como apoio terapêutico para aliviar a solidão, reduzir estresse, promover e ampliar interação social e até mesmo como um fator de proteção para suicídio.
— Cachorros podem auxiliar psicólogos, pedagogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psiquiatras e fisioterapeutas. É uma modalidade de tratamento comprovada cientificamente e que traz benefícios biopsicossociais — afirma Elaine. — Conhecida hoje como IAA, a prática é recomendada para amenizar dores emocionais, dificuldades de aprendizagem ou deficiência físico-motora.
Mas como nascem os cães de suporte emocional? Qualquer cachorro pode exercer a função, mas é preciso ter treinamento e vocação.
— Sigo a regra da focinheira. Não vou treinar um pitbull, um doberman. Essas raças não têm condições de frequentar o metrô ou outro transporte público, já que podem deixar outras pessoas desconfortáveis — diz a adestradora Daniela Liguori, que prefere trabalhar com raças consideradas mais fofas, como golden retriever, beagle, labrador e vira-latas. — Mais importante do que treinar um cão obediente, é modular o comportamento dele como um cachorro calmo para equilibrar o tutor — explica Daniela.